John Perry Barlow (1947-2018) teve uma vida incrível, sem dúvidas.
Na década de 1970, foi poeta e letrista da cultuada banda Grateful Dead, surgida em Palo Alto, California, em um período de efervescência da contra-cultura estadunidense. Aos vinte e poucos anos, Barlow esteve em contato direto com Jerry Garcia, Bob Weir, Allen Ginsberg, Janis Joplin e Bob Dylan. Nos EUA, Barlow foi cultuado pelos Deadheads -- como é chamada a base de fãs do Grateful Dead -- por suas contribuições líricas ao som experimental da banda, que até hoje possui uma legião fiel de seguidores. Aos trinta anos de idade, escreveu os Princípios para Vida Adulta, uma lista até hoje influente.
Sujeito libertário, passou boa parte dos anos 1980 em um rancho nos EUA, até o momento em que "descobriu a internet" em seus primórdios e passou a contribuir ativamente em comunidades virtuais pioneiras, como a WELL -- um sistema de comunicação via bullet board system profundamente influenciado por visões comunais e utópicas de "comunidades virtuais" (ver o importante estudo de Fred Turner, na Technology and Culture, sobre a ideologia de contracultura dos gestores da WELL). Impulsionado pelos debates gestados em comunidades virtuais como os propiciados pela WELL, Barlow formou uma ampla rede de contatos com jornalistas do setor de tecnologia, ganhando espaço para suas (sempre ousadas) reflexões em revistas especializadas como a Wired e cadernos de tecnologia do início da década de 1990.
Muito se fala sobre o que Barlow fez durante a década de 1990 e seu impacto na formatação de um certo modo de pensar a internet. A cristalização desse tipo de pensamento está, certamente, na Declaração de Independência do Ciberespaço de 1996, na qual Barlow defende a criação de uma "civilização da mente", estruturada em "ideias, transações e relacionamentos próprios", com a completa rejeição do "mundo industrial", formado por "gigantes de carne e aço". Esse documento -- escrito antes de uma apresentação de Barlow no Fórum Econômico de Davos em resposta a Telecommunications Competition and Deregulation Act aprovada pelo Congresso dos EUA e sancionada por Bill Clinton -- é um dos documentos mais citados e criticados na literatura de internet governance, justamente por simbolizar o ideal máximo de rejeição de jurisdições e de tentativas de controle governamental da internet. Qualquer obra que se preste a fazer uma historiografia das ideias sobre internet e cultura digital -- seja Manuel Castells, Tim Wu ou Evgeny Morozov -- irá mencionar esse texto.
Sem dúvidas, a Declaração é importante enquanto documento histórico. Ela sintetiza o ciber-libertarianismo de pioneiros de comunidades virtuais. Porém, ao meu ver, há um feito muito maior por parte de Barlow, com consequências políticas muito mais importantes do que a declaração do ciberespaço. Trata-se da criação da Electronic Frontier Foundation (EFF) em 1990, ao lado do ativista John Gilmore e do empreendedor Mitch Kapor.
EFF enquanto empreendimento político
A Electronic Frontier Foundation (EFF) já nasceu com a influência intelectual de Barlow, que sempre se referia à internet como "nova fronteira eletrônica". Daí a utilização da expressão Electronic Frontier no próprio nome da entidade sem fins lucrativos.
Importante pensar que Barlow, aos quarenta e poucos anos, ainda tinha fôlego para pensar um outro tipo de ativismo, para além das fronteiras do WELL e das coesas comunidades virtuais, ainda vistas como agrupamentos underground e de contracultura. A EFF pode ser vista como um empreendimento político que buscava essa transposição, essa ponte, entre dois mundos: o mundo mainstream do policy -- das discussões sobre projetos de lei no Congresso, políticas públicas e intervenção governamental -- e o mundo underground da cultura libertária online, com sua ideologia californiana de "construir ferramentas para mudar o mundo" e "expandir o intelecto humano" (algo que remonta às ideias fundantes de Douglas Engelbart e J. C. Licklider). Como pilares dessa ponte, estavam os direitos civis no uso da internet.
O livro seminal de Howard Rheingold, Virtual Community (1993), detalha precisamente como que a criação da EFF foi impulsionada por uma série de exageros criminalizantes e investigações absurdas por parte do Federal Bureau of Investigation (FBI) nas operações Sun Devil. Tanto John Perry Barlow quanto Mitch Kapor haviam sido contatados pelo FBI por investigações de roubo de propriedade (códigos da Apple) e estavam cientes de processos de incriminação de hackers conhecidos como "Acid Phreak" (Elias Lapodoulos) e "Phiber Optik" (Mark Abene), em um caso de derrubada do sistema operacional da AT&T. Como detalha Rheingold, Barlow, Karpor e Gilmore perceberam que as ações do serviço secreto e do FBI entre 1990 e 1991 não eram fenômenos temporários, mas representavam uma mudança estrutural de utilização do sistema criminal contra hackers e cyberativistas, o que demandaria a mobilização de advogados e uso estratégico de argumentos do direito constitucional estadunidense para defesa das liberdades civis online:
Na análise de Rheingold, a EFF se propôs uma tarefa dificílima no início dos anos 1990: mostrar para as pessoas que elas estavam prestes a perder direitos digitais das quais elas nem estavam cientes -- tarefa semelhante ao que a Coalizão Direitos na Rede se presta a fazer no Brasil hoje, ao defender ativamente o Marco Civil da Internet e direitos que milhões de brasileiros não estão cientes de sua existência (como neutralidade de rede e proteção de dados pessoais).
A EFF tornou-se uma grande liderança civil, em nível organizacional, na defesa dos direitos digitais nos EUA e no mundo. Muitas organizações civis de defesa de direitos digitais na América Latina se inspiram, com maior ou menos intensidade, na experiência da EFF. Os adesivos da ONG -- popularizados por Aaron Swartz e Edward Snowden após os trágicos eventos de 2013 -- acompanham laptops e computadores de ativistas de várias partes do mundo. Trata-se de caso de empreendimento político, ou inovação política para usar um termo de Albert Hirschman, que não existiria sem os insights e o esforço criativo de John Perry Barlow.
John Perry Barlow em São Paulo
Falta, ainda, uma historiografia do movimento brasileiro de cultura digital e suas divergências com o ideal ciber-libertário californiano. Como sustenta Hermano Vianna, "precisamos de uma boa história das cibercomunicações nacionais". Há, no entanto, alguns registros notáveis de encontros que catalisaram o ciberativismo brasileiro em nível de política, como encontro de 1995 sobre os "aspectos sócio-culturais da internet" organizado por antropólogos como Vianna, Jayme Aranha Filho e a turma do Ibase e da Rede Nacional de Pesquisa (RNP), e os registros da organização do encontro Mídia Tática em 2003, em São Paulo, que reuniu John Perry Barlow e o então ministro da Cultura, Gilberto Gil, para um debate com hackers, ativistas e agitadores culturais.
É particularmente interessante o que há por trás do encontro de John Perry Barlow e Gilberto Gil em São Paulo, quinze anos atrás, na Casa das Rosas. Há um relato precioso de Ricardo Rosas -- ativista de Fortaleza formado em comunicação social pela USP, criador do extinto projeto Rizoma.net e divulgador dos conceitos de tactical media no Brasil até seu falecimento precoce em 2007 -- sobre os perrengues e dificuldades de organizar o evento Mídia Tática em 2003. Nesse relato, fica clara a influência do ativista e teórico holandês Geert Lovink e do projeto Next Five Minutes (1999) na concepção do Mídia Tática Brasil de 2003. Rosas já havia traduzido ensaios de Lovink para o Centro de Mídia Independente, explicando o conceito de "mídia tática", que possui uma curiosa aproximação teórica com A Invenção do Cotidiano de Michel de Certeau. Mídias táticas, para Lovink, são mídias de crise, crítica e oposição. Traduzindo para o universo da internet, implica dizer: não apenas utilizamos textos, protocolos e artefatos, mas o podemos fazer "de formas muito mais criativas e rebeldes do que já tinha sido imaginado", por meio de estéticas de "apropriação e engano", "truques engenhosos", "manobras" e "situações polifórmicas". O desafio era repensar esses usos rebeldes em uma sociedade marcada pelas desigualdades e violências.
Infelizmente, não é possível entrevistar Rosas e conhecer mais a fundo as motivações para convidar John Perry Barlow para o Brasil -- ou mesmo se o convite ocorreu por influência de Vianna e outros grupos -- e de que modo esse convite foi pensado em um contexto de divulgação do conceito de mídias táticas. Restam apenas seus textos. No entanto, "uma boa história" da cultura digital brasileira poderia se concentrar na curiosa junção entre Ricardo Rosas, a artista Giseli Vasconcelos, muito conectada com artistas locais da Amazonia e "investigadora das "colaborações criativas entre o Norte e o Centro-Sul do país", e a ativista Tatiana Wells, que estudou na Universidade de Westminster e era próxima de Richard Barbrook, diretor do Hypermedia Research Centre. Esse é o trio que cria uma rede de investigações sobre mídia tática em 2002 e que, em março de 2003, junta diferentes panelas e tribos no evento Mídia Tática de 2003.
O Mídia Tática não é importante apenas pelo curioso encontro de Gilberto Gil, Richard Barbrook e John Perry Barlow. Trata-se de um evento que, com intensidade ainda não mensurada, influencia a agenda de cultura digital criada no primeiro governo Lula (2003-2006), que se conecta com muitas práticas de baixo para cima, espalhadas por coletivos de mídia tática e de cultura digital de diferentes regiões do país. No prefácio da edição brasileira de Futuros Imaginários, realizada pelo coletivo "A Classe do Novo" (do qual Rosas e Tatiana Wells fizeram parte), é relatada a conexão entre os "mídia-táticos", a equipe de Gil e Barlow:
Há relatos de que as discussões entre Barbrook e Barlow em São Paulo foram profundamente divergentes. O trabalhismo fortemente comunista de Barbrook, bastante característico da esquerda inglesa, divergia profundamente dos ideais libertários da Revolução Estadunidense de 1776 de Barlow. Barbrook dizia que Barlow "se proclamava o Thomas Jefferson da Internet", em tom crítico aos ideais da democracia jeffersoniana. Em Futuros Imagináveis, ele afirma que Barlow e os "capitalistas hippies da EFF não podiam enxergar possibilidades socialistas" na experiência histórica da internet.
A questão que permanece, no entanto, é: de que modo essas orientações divergentes produziram uma assemblage conceitual para os ativistas brasileiros? Como que a experiência de Barlow e da EFF foram reaproveitadas, remanobradas e repensadas de forma criativa pelos brasileiros? Como que a cultura digital brasileira fez um uso tático dos ferramentais e artefatos celebrados pelo próprio Barlow?
EFF enquanto empreendimento político
A Electronic Frontier Foundation (EFF) já nasceu com a influência intelectual de Barlow, que sempre se referia à internet como "nova fronteira eletrônica". Daí a utilização da expressão Electronic Frontier no próprio nome da entidade sem fins lucrativos.
Importante pensar que Barlow, aos quarenta e poucos anos, ainda tinha fôlego para pensar um outro tipo de ativismo, para além das fronteiras do WELL e das coesas comunidades virtuais, ainda vistas como agrupamentos underground e de contracultura. A EFF pode ser vista como um empreendimento político que buscava essa transposição, essa ponte, entre dois mundos: o mundo mainstream do policy -- das discussões sobre projetos de lei no Congresso, políticas públicas e intervenção governamental -- e o mundo underground da cultura libertária online, com sua ideologia californiana de "construir ferramentas para mudar o mundo" e "expandir o intelecto humano" (algo que remonta às ideias fundantes de Douglas Engelbart e J. C. Licklider). Como pilares dessa ponte, estavam os direitos civis no uso da internet.
O livro seminal de Howard Rheingold, Virtual Community (1993), detalha precisamente como que a criação da EFF foi impulsionada por uma série de exageros criminalizantes e investigações absurdas por parte do Federal Bureau of Investigation (FBI) nas operações Sun Devil. Tanto John Perry Barlow quanto Mitch Kapor haviam sido contatados pelo FBI por investigações de roubo de propriedade (códigos da Apple) e estavam cientes de processos de incriminação de hackers conhecidos como "Acid Phreak" (Elias Lapodoulos) e "Phiber Optik" (Mark Abene), em um caso de derrubada do sistema operacional da AT&T. Como detalha Rheingold, Barlow, Karpor e Gilmore perceberam que as ações do serviço secreto e do FBI entre 1990 e 1991 não eram fenômenos temporários, mas representavam uma mudança estrutural de utilização do sistema criminal contra hackers e cyberativistas, o que demandaria a mobilização de advogados e uso estratégico de argumentos do direito constitucional estadunidense para defesa das liberdades civis online:
The EFF founders saw, as the first reporters from the mass media did not, that Sun Devil was not just a hacker bust. The EFF founders agreed that there was a good chance that the future of American democracy could be strongly influenced by the judicial and legislative structures beginning to emerge from cyberspace. The reasons the EFF helped defend Acid, Optik, and Scorpion as well Neidorf and Jackson had to do with the assumptions made by the Secret Service about what they could and could not do to citizens. "The Electronic Frontier Foundation will fund, conduct, and support legal efforts to demonstrate that the Secret Service has exercised prior restraint on publications, limited free speech, conducted improper seizure of equipment and data, used undue force, and generally conducted itself in a fashion which is arbitrary, oppressive and unconstitutional", Barlow declared in an early manifesto. "In addition, we will work with the Computer Professionals for Social Responsibility and other organizations to convey to both the public and the policy-makers metaphors which will illuminate the more general stake in liberating Cyberspace" (p. 221).
Na análise de Rheingold, a EFF se propôs uma tarefa dificílima no início dos anos 1990: mostrar para as pessoas que elas estavam prestes a perder direitos digitais das quais elas nem estavam cientes -- tarefa semelhante ao que a Coalizão Direitos na Rede se presta a fazer no Brasil hoje, ao defender ativamente o Marco Civil da Internet e direitos que milhões de brasileiros não estão cientes de sua existência (como neutralidade de rede e proteção de dados pessoais).
A EFF tornou-se uma grande liderança civil, em nível organizacional, na defesa dos direitos digitais nos EUA e no mundo. Muitas organizações civis de defesa de direitos digitais na América Latina se inspiram, com maior ou menos intensidade, na experiência da EFF. Os adesivos da ONG -- popularizados por Aaron Swartz e Edward Snowden após os trágicos eventos de 2013 -- acompanham laptops e computadores de ativistas de várias partes do mundo. Trata-se de caso de empreendimento político, ou inovação política para usar um termo de Albert Hirschman, que não existiria sem os insights e o esforço criativo de John Perry Barlow.
John Perry Barlow em São Paulo
Falta, ainda, uma historiografia do movimento brasileiro de cultura digital e suas divergências com o ideal ciber-libertário californiano. Como sustenta Hermano Vianna, "precisamos de uma boa história das cibercomunicações nacionais". Há, no entanto, alguns registros notáveis de encontros que catalisaram o ciberativismo brasileiro em nível de política, como encontro de 1995 sobre os "aspectos sócio-culturais da internet" organizado por antropólogos como Vianna, Jayme Aranha Filho e a turma do Ibase e da Rede Nacional de Pesquisa (RNP), e os registros da organização do encontro Mídia Tática em 2003, em São Paulo, que reuniu John Perry Barlow e o então ministro da Cultura, Gilberto Gil, para um debate com hackers, ativistas e agitadores culturais.
É particularmente interessante o que há por trás do encontro de John Perry Barlow e Gilberto Gil em São Paulo, quinze anos atrás, na Casa das Rosas. Há um relato precioso de Ricardo Rosas -- ativista de Fortaleza formado em comunicação social pela USP, criador do extinto projeto Rizoma.net e divulgador dos conceitos de tactical media no Brasil até seu falecimento precoce em 2007 -- sobre os perrengues e dificuldades de organizar o evento Mídia Tática em 2003. Nesse relato, fica clara a influência do ativista e teórico holandês Geert Lovink e do projeto Next Five Minutes (1999) na concepção do Mídia Tática Brasil de 2003. Rosas já havia traduzido ensaios de Lovink para o Centro de Mídia Independente, explicando o conceito de "mídia tática", que possui uma curiosa aproximação teórica com A Invenção do Cotidiano de Michel de Certeau. Mídias táticas, para Lovink, são mídias de crise, crítica e oposição. Traduzindo para o universo da internet, implica dizer: não apenas utilizamos textos, protocolos e artefatos, mas o podemos fazer "de formas muito mais criativas e rebeldes do que já tinha sido imaginado", por meio de estéticas de "apropriação e engano", "truques engenhosos", "manobras" e "situações polifórmicas". O desafio era repensar esses usos rebeldes em uma sociedade marcada pelas desigualdades e violências.
Infelizmente, não é possível entrevistar Rosas e conhecer mais a fundo as motivações para convidar John Perry Barlow para o Brasil -- ou mesmo se o convite ocorreu por influência de Vianna e outros grupos -- e de que modo esse convite foi pensado em um contexto de divulgação do conceito de mídias táticas. Restam apenas seus textos. No entanto, "uma boa história" da cultura digital brasileira poderia se concentrar na curiosa junção entre Ricardo Rosas, a artista Giseli Vasconcelos, muito conectada com artistas locais da Amazonia e "investigadora das "colaborações criativas entre o Norte e o Centro-Sul do país", e a ativista Tatiana Wells, que estudou na Universidade de Westminster e era próxima de Richard Barbrook, diretor do Hypermedia Research Centre. Esse é o trio que cria uma rede de investigações sobre mídia tática em 2002 e que, em março de 2003, junta diferentes panelas e tribos no evento Mídia Tática de 2003.
O Mídia Tática não é importante apenas pelo curioso encontro de Gilberto Gil, Richard Barbrook e John Perry Barlow. Trata-se de um evento que, com intensidade ainda não mensurada, influencia a agenda de cultura digital criada no primeiro governo Lula (2003-2006), que se conecta com muitas práticas de baixo para cima, espalhadas por coletivos de mídia tática e de cultura digital de diferentes regiões do país. No prefácio da edição brasileira de Futuros Imaginários, realizada pelo coletivo "A Classe do Novo" (do qual Rosas e Tatiana Wells fizeram parte), é relatada a conexão entre os "mídia-táticos", a equipe de Gil e Barlow:
Richard Barbrook chegou às vésperas do festival Mídia Tática Brasil, evento de arte, mídia, política e tecnologia que havia sido, em grande parte, organizado via lista de troca de e-mails pela Internet. Barbrook participaria no debate de abertura do evento juntamente com John Perry Barlow sob a moderação do recém empossado Ministro da Cultura, Sr. Gilberto Passos Gil Moreira. Um dos assessores do ministro, Hermano Vianna, nos confessara em um telefonema prévio que o festival que organizávamos tinha relação íntima com a plataforma de governo a ser proposta no Ministério da Cultura durante a administração por vir, e ofereceu-nos a presença de Gil e Barlow no debate de abertura do festival. Com a presença do Ministro Gilberto Gil, conseguimos espaços para a realização do evento, bem como cobertura dos grandes meios de comunicação. (...) Era março de 2003, e o que não sabíamos naquele momento era a velocidade com que muitas ideias e práticas ali desenvolvidas seriam rapidamente incorporadas às agendas políticas e corporativas do Brasil.
Há relatos de que as discussões entre Barbrook e Barlow em São Paulo foram profundamente divergentes. O trabalhismo fortemente comunista de Barbrook, bastante característico da esquerda inglesa, divergia profundamente dos ideais libertários da Revolução Estadunidense de 1776 de Barlow. Barbrook dizia que Barlow "se proclamava o Thomas Jefferson da Internet", em tom crítico aos ideais da democracia jeffersoniana. Em Futuros Imagináveis, ele afirma que Barlow e os "capitalistas hippies da EFF não podiam enxergar possibilidades socialistas" na experiência histórica da internet.
A questão que permanece, no entanto, é: de que modo essas orientações divergentes produziram uma assemblage conceitual para os ativistas brasileiros? Como que a experiência de Barlow e da EFF foram reaproveitadas, remanobradas e repensadas de forma criativa pelos brasileiros? Como que a cultura digital brasileira fez um uso tático dos ferramentais e artefatos celebrados pelo próprio Barlow?
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