A expectativa pelo nascimento de um filho provoca sensações intensas em um pai. A ansiedade é grande e a imaginação vai a mil. Como será o rostinho dele? Será parecido comigo? Ou carregará os traços da mãe? Quem sabe uma bela mistura dos dois? Quais serão os traços de sua personalidade? Será um menino mais quietinho, como eu fui na infância? Ou será um moleque espevitado como foi a Priscila quando criança?
Essas dúvidas são deliciosas. Fico fascinado pela ideia de que existe ali um novo ser, quase pronto para vir ao mundo, com suas características físicas e psicológicas meio que determinadas. Esse tipo de fascinação com uma ideia abstrata de reprodução tem uma certa intensidade quando se aprende isso na escola. Mas a sensação de experimentar isso pra valer -- ver os seus genes cruzados com outra pessoa na formação de um bebê -- é mil vezes mais forte do que qualquer compreensão racional de como as coisas funcionam. Você fica besta, pensando "que loucura tudo isso".
Talvez os médicos obstetras e os profissionais da área percam esse fascínio que estou descrevendo por acompanharem inúmeras vezes essa espécie de milagre. Talvez um biólogo darwinista também não veja muita graça. Ele pode dizer que isso é simplesmente a reprodução da espécie, muito parecido com o que acontece com qualquer outro mamífero. Mas eu te garanto que acompanhar esse processo sem essas lentes racionalizadoras é muito mais rico. É incrível ver o primeiro ultrassom, aos dois meses de gestação, e sentir uma inquietação profunda com os formatos estranhos e a potência de crescimento daquele pequeno ser, ainda do tamanho de um grão. Depois, acompanhar todo o processo de transformações que ele provoca na mãe, como se toda uma inteligência estivesse ali, escondida, pronta para expandir seios, mover órgãos e criar um ninho interno. Tudo acontecendo instintivamente, como se a vida assumisse o controle da situação.
Acho que isso -- essa absoluta impotência da razão instrumental -- provoca uma perplexidade e uma certa paz ao sujeito dito moderno. Pois o que você pode fazer é pouco. O pai e a mãe podem se cuidar, planejar atividades físicas adequadas e mudar hábitos, abandonando as festas regadas à álcool em prol de passeios no parque com água de coco. Mas o que está acontecendo no útero é incontrolável. Você não tem certeza se seu filho será saudável, se ele sofrerá de alguma síndrome, se ele terá o rosto parecido com o seu. Você tem exames médicos, apoio científico e previsões. Mas todo esse aparato da razão apoia-se em aproximações, hipóteses e crenças nos dados produzidos pelos homens -- o que é extremamente valioso, mas que mesmo assim não tem o poder de tudo prever e tudo controlar. Isso no começo me assustava, mas depois provocou uma profunda paz de espírito: é a vida; é preciso aprender a admirá-la.
Sei que essa narrativa é socialmente e historicamente situada. Entre as famílias mais ricas do mundo já é possível determinar geneticamente as características de um filho. Fala-se de engenharia genética e em "design de bebês" nos Estados Unidos. Samsung, Oculus e outras empresas de realidade virtual também investem fortemente em "ultrassons internos" (possibilidade dos pais enxergarem o bebê por dentro do útero). Todas essas tecnologias bilionárias, no entanto, só me fazem sentir pena de pessoas com essa obsessão pelo controle, que acabam ajudando a criar um cenário mais próximo do Brave New World imaginado por Adolf Huxley. Estimulam uma cultura da intervenção e do controle na gestação para que empresas ofereçam serviços especializados para essas elites, criando novos mercados a partir desses valores. Fico feliz de não fazer parte deste jogo.
O que há de gostoso nesse processo todo de espera de um filho é a incerteza, a ansiedade natural e o estímulo à imaginação. Isso é bom para o pai e para a mãe. É um exercício de humildade. Dizemos que estamos esperando o Antonio. E se falo de espera, é por que já acredito na sabedoria daqueles instintos aflorados na gestação e que tomaram as rédeas da situação. É por que acredito que existe uma inteligência incrível ali operando, em um ciclo que tem começo, meio e fim.
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