Slavoj Žižek

Mês passado eu havia lido brevemente uma dissertação de Mestrado (pelo portal Domínio Público) cujo tema era "A filosofia do Direito em Slavoj Žižek", o que me chamou a atenção por justamente nunca ter ouvido falar neste tal de Žižek, tampouco ter noção de suas teorias filosóficas.

Ao ler o trabalho, me deparei com os conceitos zizekianos pós-marxistas de uma nova construção do materialismo dialético, através do reconhecimento de antagonismos da ordem social, bem como do conceito de paralaxe, ou seja, modificação da posição do observador, criando o efeito de deslocamento do objeto de análise. Em outras palavras: de se analisar determinado objeto ou tema através de outra perspectiva, desta vez crítica, identificando a ideologia presente em cada discurso ou fato apresentado como "neutro".

Ao pesquisar sobre Slavoj Žižek, descobri que o Professor de Filosofia da Universidade de Liubliana (Eslovênia) é um dos filósofos contemporâneos mais aclamados da esquerda europeia e que seus textos são multiculturais, envolvendo conceitos clássicos de filosofia, cinema (Hitchcock, em especial), política e cultura pop.



Ontem novamente o acaso me colocou frente as ideias de Slavoj Žižek. Me chamou atenção um texto entitulado A proibição de pensar, escrito por Luís Carlos Lopes. De cara, Lopes afirma: "O título deste artigo foi tomado de empréstimo de Slavoj Zizek, um dos pensadores europeus mais conscientes e merecedores de atenção, por diversas razões. Sua clareza e produtividade espantam a quem está acostumado a estilos obscuros e ilegíveis, ou ainda, a pensamentos circulares que não levam a nada. Nele, os problemas são formulados e as respostas fluem sem medo de errar. Seu senso moral é imbatível, bem como seu compromisso com um pensamento renovado, sem esquecer as longas raízes de uma visão crítica do mundo, nascida no século XIX e desenvolvida, com muitos percalços, no século passado."

O texto, que é brilhante, é fortemente influenciado por Žižek, em especial por seu texto "Bem vindo ao Deserto do Real", que nos remete à Platão e Matrix. Luís Carlos Lopes, após divagar sobre alguns conceitos zizekianos, afirma no final: "No mundo moderno, as possibilidades de esclarecer são infinitamente maiores do que no passado. Todavia, os meios do esclarecimento são os mesmos que servem para produzir descerebrados, pessoas que nada ou pouco reclamam, aceitando o destino como algo inexorável e impossível de mudar. Tudo depende de quem tem a propriedade ou consegue influenciar os meios humanos e técnicos de comunicação".

Genial (e real).

Fiquei curioso com as ideias do filósofo esloveno. Vesti meu cachecol e um paletó e parti para a Biblioteca Central da UEM. Lá, encontrei duas obras. A primeira, "Eles não sabem o que fazem" e a segunda, "Um Mapa da Ideologia", que é um apanhado de textos clássicos e contemporâneos sobre o conceito de ideologia escritos por Theodor Adorno, Jacques Lacan, Louis Althusser, Richard Rorty, Fredric Jameson e outros. Os textos foram organizados por Slavoj Žižek, que escreve também a introdução "Um espectro da Ideologia".

Emprestei o livro ontem e passei boa parte da noite lendo. E concordo com Žižek: não só um processo denunciado como "ideológico por excelência" é ideológico, mas também o seu inverso o é. A renúncia pós-moderna à ideologia é uma atitude ideológica: "Ideologia pode designar qualquer coisa, desde uma atitude contemplativa que desconhece sua dependência em relação à realidade social, até um conjunto de crenças voltado para a ação; desde o meio essencial em que os indivíduos vivenciam suas relações com uma estrutura social até as idéias falsas que legitimam um poder político dominante" (ZIZEK, Slavoj. Um mapa da Ideologia. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996, p. 9).

Žižek também é muito influenciado por Hegel, Lacan. Glyn Daly afirma que: "O paradigma Žižekiano – se é que podemos falar nesses termos – extrai sua vitalidade de duas grandes fontes filosóficas: o idealismo alemão e a psicanálise. Em ambos os casos, o interesse central de Žižek recai sobre certa falta/excesso na ordem do ser. No idealismo alemão, esse aspecto explicita-se mais e mais através da referência ao que se poderia chamar de uma “loucura” inexplicável, que é inerente e constitutiva do cógito e da sujetividade como tal. Na psicanálise, esse aspecto temático da subjetividade deslocada é mais desenvolvida com respeito ao conceito freudiano de pulsão de morte. A pulsão de morte surge, precisamente como resultado dessa lacuna ou furo na ordem do ser" (DALY, Glyn. Arriscar o impossível – conversas com Žižek. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 43).

Em seus textos, sempre há referências à teorias desses pensadores, bem como de Marx. Nesta entrevista do programa Roda Viva (que vale muito a pena assistir) Slavoj Žižek deixa isso bem claro.


Mais brilhante ainda é o livro virtual lançado pelos estudantes de Filosofia da Universidade Federal da Santa Catarina (UFSC) em Março de 2009, entitulado "Lacunas do Real - Leituras de Slavoj Žižek":


O trabalho (que pode ser lido aqui) é uma coletânea de cinco artigos que envolvem o pensamento "pós-moderno" zizekiano e a filosofia política, direitos humanos, religião, crítica da razão pura e capitalismo.

Como bem colocou Sandro Bazzanella, autor de um dos artigos, a questão que fica é: "O que Žižek faz articulando conceitos filosóficos, psicanáliticos, sociológicos, cinematorgráficos, desenhos animados... pode ser considerado filosofia?"

Eu acho que sim.

E penso que Slavoj Žižek não é apenas um pensador cult contemporâneo, mas sim um filósofo dos tempos modernos, que tem a capacidade de observar fenômenos culturais (inclusive os classificados como pop) através de uma outra perspectiva. Numa paralaxe.

E é isso que devemos fazer.

Precisamos pensar.

4 comentários:

  1. ah, então é com ele aquele filme A VIDA AQUÁTICA DE SLAVOJ ZIZEK?

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  2. cara curti o post, vou ler algo dele! valeu

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  3. Ah!! Rafa, que sincronicidade!! Usei na minha tese o Slavoj Zizek, pois adorei a sua maxima e relacionei-a para discutir sobre o Estado e a sua posição em relação as comunidades rurais extrativistas da mata Atlantica, que Zizek usa sobre o paradoxo moderno: "Eu sei de tudo, mas ajo como se não soubesse de nada". E tem também um video muito bom dele no yotube, em que aborda a questão ambiental de forma magistral (em um lixão), veja: ''A ecologia é o ópio do povo'' è muito didático e inteligente.
    O cara é bom demais!! adorei a ironia dele em relação ao nosso sistema e a postura que desenvolvemos de forma tão superficial.
    Parabéns para o Spack por ter levado vc a ele. Fiquei muito feliz!! bjs e te amo

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