Há uma preocupação enorme por parte das modernas potências ocidentais em repensar o capitalismo numa faceta humanizada. Além da inclusão do "social" no conceito de crescimento econômico (repare que o termo em voga é crescimento econômico-social e não apenas crescimento econômico), os organismos multilaterais "abrançaram a causa" de Amartya Sen de considerar o desenvolvimento pela perspectiva da capacitação das pessoas através da redução da pobreza. Crescimento econômico não implica necessariamente em desenvolvimento. Esse é novo dogma internacional. Os países devem integrar suas economias ao mercado mundial e utilizar de políticas públicas focalizadas que reduzam a pobreza e utilizem de inovação institucional inclusiva, permitindo que essas pessoas saíam da condição de ausência de escolha e miserabilidade e possam escolher uma formação educacional específica para algum segmento do mercado. O que está por trás disso é uma ideia de homogeneização do padrão internacional de políticas para o crescimento de economias capitalistas focado no capital social, isto é, na formação de obra de obra com baixo potencial conflitivo para novos regimes de produção integrados em escala global.
O Banco Mundial tem utilizado de práticas discursivas nesse sentido. Em 2007, por exemplo, a instituição criou o Diagnostic Facility for Shared Growth, institucionalizado especificamente para estudar iniciativas relacionadas com a agenda do "crescimento inclusivo". Os objetivos oficiais, como relata Gallina Vincelette, são "melhorar a compreensão de temas relacionados ao crescimento inclusivo, identificar as fontes e priorizar os elementos para um amplo crescimento econômico através da combinação de análises micro e macro-econômicas". O dinheiro para essas pesquisas vem dos governos da França, Alemanha, Holanda, Suécia, Suíça e Reino Unido.
Os pesquisadores do Banco Mundial utilizam diversos nomes para crescimento inclusivo, como broad-based growth, shared growth ou mesmo pro-poor growth. Os termos querem dizer a mesma coisa: para que o crescimento seja sustentável a longo prazo, ele deve atingir uma ampla base setorial e deve incluir boa parte da força de trabalho de um país. Essa definição de crescimento inclusivo implica numa relação direta entre os determinantes micro e macro do crescimento. A dimensão micro captura a importância da transformação estrutural para diversificação econômica e competição, incluindo a "destruição criativa" de empresas e empregos. A "Comissão para o Crescimento e Desenvolvimento", montada em 2006 por economistas do mundo todo (incluindo o brasileiro Edmar Bacha, do Instituto Casa das Garças), publicou a seguinte seguinte mensagem no ano de 2008: a desigualdade sistemática de oportunidades é "tóxica", pois pode atrapalhar o processo de crescimento através de canais políticos ou conflitos. O relatório completo pode ler lido on-line.
Interessante é notar que o Banco Mundial está muito instigado em saber como o Brasil está lidando com o crescimento econômico e redução das desigualdades. Quais políticas públicas o país está utilizando para promover a inovação institucional incluvisa e permitir a governabilidade sem tensões sociais? O Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) - hoje maior que o próprio Banco Mundial em termos de empréstimo (conforme dados de David Trubek) - também está preocupado com a governança dos sistemas de inovação inclusiva. As duas instituições, uma sediada em Washington e a outra no Rio de Janeiro, juntamente com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) vão promover nos dias 24 e 25 de outubro uma conferência técnica sobre políticas de inovação para o crescimento inclusivo, "crescimento este que gera oportunidades de emprego e consumo para grandes segmentos da população e é movido pelo aumento da produtividade e competitividade das empresas, especialmente entre as jovens", como diz o anúncio no site do BNDES.
Os principais objetivos da conferência são (i) aumentar a compreensão das autoridades e líderes empresariais sobre as políticas de inovação apropriadas para um crescimento mais inclusivo, focado nas questões emergentes, e (ii) oferecer um fórum para compartilhar experiências internacionais para facilitar a implementação e melhorar a eficácia das políticas de inovação nas economias emergentes.
Segundo o informativo do BNDES, o evento é uma forma de benchmarking (aprendizado horizontal comparado, inspirado em modelos de gestão empresarial) que tem por finalidade a troca de experiências sobre crescimento e governança: "A conferência foi concebida para facilitar a troca de experiências, aprendizagem conjunta e capacitação sobre a prática da política de inovação para um crescimento mais inclusivo, com foco nas tendências em níveis globais, nacionais e subnacionais, instrumentos de política relevantes, novos arranjos institucionais para apoiar a inovação, novas funções dos atores envolvidos no processo de inovação e avaliação da eficácia da política. (...) A conferência será patrocinada pelo BNDES, pelo Diagnostic Facility for Shared Growth (DFSG, Instrumento de Diagnóstico para o Crescimento Compartilhado), gerido pelo Banco Mundial como parte de suas atividades de compartilhamento de conhecimento, pela Unidade de Gestão Nacional do Brasil do Banco Mundial, e pela Diretoria da OCDE para Ciência, Tecnologia e Indústria".
A questão que fica é: há um potencial emancipatório que pode ser aproveitado por tais inovações institucionais "inclusivas" ou trata-se apenas de uma tentativa de instaurar um modelo de governança e produção de riqueza globalmente integrado capaz de suavizar tensões políticas contrárias à ideologia do sistema?
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