Sobre a "escória do mundo"


[ por Lucas Ferreira Cabreira, em colaboração para o e-mancipação ]

Este é um panfleto originalmente publicado pelo Partido Nazista em 1943, para ser utilizado no programa de educação interno do Partido, e republicado pelo Wehrmacht para distribuição entre os soldados em 1944. Intitulado “O judeu como parasita mundial”, apontava na Parte Dois os judeus como “refugo racial”, verdadeira “escória da sociedade”.

Além disso, o autor do texto não hesita em “mostrar” que os “grandes judeus” foram os “maiores corruptores”, “denunciando” a falta do “conceito de honra” dos judeus. Um texto, enfim, que traz várias concepções terríveis, cruéis, mas também ideológicas: fruto da nefasta propaganda nazista ao final da Segunda Guerra.


"Eu falei que não ia estuprar você porque você não merece [...]
Os direitos humanos no Brasil só defende bandidos, estupradores, marginais, sequestradores, e até corruptos. Dia internacional dos direitos humanos no Brasil serve para isso [...]
Esteve agora se reunindo na Unasul reunida com a escória da América Latina. Tratando entre outras coisa (sic) pra abertura do espaço aéreo pra aqui da Unasul [...]
Já tem 11 mil cubanos aqui. Milhares de haitianos. Esse congresso aqui votou sem ler a isenção de visto pra iraniano entrar no nosso país. Mujica aceitou agora presidiários, terroristas de Guantanamo. Estamos trazendo pra dentro do Brasil o que há de pior no mundo: a escória do mundo pra dentro do Brasil”.
Pessoas que merecem estupro; direitos humanos servem para “defender bandidos” e “corruptos”; por fim, cubanos, haitianos e iranianos como escória do mundo. Não satisfeito, em declaração na Câmara em 10/12, às 15h30, tentou se justificar “contextualizando” a situação -- como se existisse justificativa para “merecer” estupro ou para ser considerado “escória do mundo”.

Daqui a alguns anos, talvez olharemos para trás e recordaremos dessa fala do deputado somente como um lamentável momento do período em que vivemos. Entretanto, esse ato pode ter desdobramentos e -- assim como na Alemanha, na Itália, e em tantos outros países -- acarretar em generalização do fascismo na sociedade. 

Trata-se de um fenômeno social de direita, naturalmente conservador e radical, que aparece como contra-ataque a movimentos de transformação. No contexto do fascismo, busca-se eleger um inimigo comum a ser eliminado pelos “cidadãos de bem” com intuito de alguma “manutenção da ordem” que tal grupo supostamente ameaça. Como não lembrar os grupos paramilitares como os Camisas Negras na Itália ou a Frente Nacionalista Patria y Libertad no Chile?

A grande questão que se coloca é que o fascismo é um fenômeno conservador e antidemocrático que não aparece abruptamente. Uma vez presente na sociedade, não é possível saber os caminhos que pode tomar. Neste sentido, chama atenção a semelhança entre o discurso de repúdio aos judeus no nazismo e a “tranquilidade” com que Bolsonaro tachou imigrantes iranianos, haitianos e cubanos como “escória da sociedade”. Existe “escória no mundo”? Por muito tempo foram “os comunistas”; no nazismo, os judeus; para o parlamentar, hoje, são outras pessoas. 

O deputado que pronunciou o discurso aqui citado já se mostrou favorável à volta da ditadura. Não há coincidências aqui. Devemos dar nomes aos bois: o fascismo já está no Congresso e está fazendo espetáculo. Diferentemente deles, não devemos promover qualquer expurgo -- como talvez queira Bolsonaro. Resta o alerta: a história tende a se repetir debaixo do nosso nariz.

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