A academia e o direito da sociedade em rede


O fato de dezenas de alunos se reunirem semanalmente em salas pouco confortáveis da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP) para discutirem questões como liberdade de expressão em novos meios de comunicação (blog, microblogs, websites e redes sociais) e os desafios da regulação da proteção de dados em um contexto de big data é um sinal claro de que as constantes revoluções tecnológicas da "sociedade em rede" levantam novas questões para uma geração de juristas no país e no mundo. 

É nesse contexto de problemas inéditos, quase nunca discutidos nos arcaicos programas de graduação da maioria das faculdades brasileiras, que surgiu em meados de 2012 o Núcleo de Direito, Internet e Sociedade (NDIS), uma iniciativa de alunos da graduação e da pós-graduação em Direito da USP. 

O núcleo, idealizado por Dennys Antonialli e Francisco Brito Cruz, surgiu com o objetivo de diagnosticar os "principais impactos jurídicos e sociológicos das novas tecnologias da informação e comunicação", tendo como foco o "estudo da inovação e de sua regulação através da criaçāo de políticas públicas e de mecanismos de governança que afetem direitos fundamentais, tais como privacidade e liberdade de expressão" (cf. 'Por que a privacidade importa'). Trata-se de uma iniciativa acadêmica experimental, voltada à pesquisa e produção de conhecimento jurídico.

As atividades do núcleo inicialmente consistiram em "oficinas de formação", caracterizadas por discussões temáticas embasadas por textos acadêmicos. Em 2013, o núcleo redefiniu seus objetivos para atividades de pesquisa, adotando três premissas básicas, quais sejam: (i) independência acadêmica, tanto do setor privado como do governamental; (ii) valorização dos métodos de pesquisa empírica em direito como instrumento de produção de diagnósticos da realidade jurídica; (iii) afinidade temática com as áreas de estudo de políticas públicas e regulação (direitos fundamentais e sociologia jurídica).

No primeiro semestre de 2013, o NDIS realizou encontros semanais com enfoque em dois grandes temas, a a liberdade de expressão e a privacidade (em especial, proteção de dados). Com um grupo formado por alunos de graduação e tutores de pós-graduação, o núcleo discutiu publicações científicas e realizou atividades simuladas de processos judiciais (simulação de processo envolvendo publicações de denúncia por corrupção em um blog) e processos legislativos (simulação de elaboração de projeto de lei de proteção de dados, envolvendo interesses de grupos distintos).

Em junho, uma reunião foi realizada para anunciar as atividades do segundo semestre de 2013. O evento A Internet Para Além da Superfície: direito, tecnologia e redes anônimas, que contou com a participação dos professores Virgílio Afonso da Silva, Ronaldo Lemos e Demi Getschko, marcou o início de uma nova agenda para o NDIS: a realização de uma pesquisa coletiva sobre redes anônimas (deep web).


Novidades para o segundo semestre: reuniões e oficinas
Neste semestre, o NDIS oferecerá aos alunos de graduação da Faculdade de Direito da USP um módulo de formação na área de metodologia de pesquisa em direito e tecnologia. Segundo os coordenadores, a ideia do módulo surgiu a partir da constatação de que muitos alunos gostariam de desenvolver projetos individuais de pesquisa na área, mas não tinham segurança e/ou consistência metodológica para preparar projetos. O módulo também servirá como etapa preparatória para aqueles que desejarem se envolver com a linha de pesquisa sobre redes anônimas (“deep web”), inaugurada no mês de junho.

Diferentemente do semestre passado, o número de reuniões será reduzido e composto por dois tipos de atividades: (i) reuniões ordinárias; e (ii) oficinas livres. As reuniões ordinárias traçarão uma linha de formação metodológica, sempre com a participação de convidados especialistas, que proporão dinâmicas compatíveis com os temas de cada reunião (para saber mais veja o cronograma abaixo). As “oficinas livres” consistirão na apresentação e discussão de trabalhos e/ou projetos de pós graduandos ligados ao NDIS. A ideia é permitir que os alunos consigam discutir os projetos nas oficinas livres a partir do instrumental que lhes será conferido ao longo das reuniões ordinárias. Todas as reuniões contarão com textos de leitura obrigatória.

O NDIS publicou um edital de seleção de novos membros para as atividades do segundo semestre de 2013. As informações estão todas no blog do núcleo (ver aqui). As inscrições devem ser feitas até 23 de agosto. Os nomes dos convidados das reuniões de metodologia (pesquisadores formados em universidades brasileiras e estrangeiras) serão divulgados nas próximas semanas.

As potencialidades do NDIS são enormes. Além dos contatos desenvolvidos com outros centros de pesquisa, como o Alexander von Humboldt Institute for Internet and Society em Berlim e o Center for the Study of Law and Society em Berkeley, os acadêmicos de USP podem lançar as bases para novas pesquisas em direito, tecnologia e sociedade - equipando a produção científica em direito com métodos empíricos e temas interdisciplinares.

Uma nova sociedade demanda uma nova postura acadêmica. A história do Núcleo de Direito, Internet e Sociedade está apenas começando.

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