Ser e Tempo



Quem é o homem épico? Não é mais o momento de saber. Cabe procurar o homem frustrado e desprezado, desesperado e revoltado. E quem é ele? Esse novo herói é aquele que duela pelo tempo e pelo espaço. E não se trata do tempo material e do espaço material, e sim do tempo e do espaço apriorísticos, apropriados pelo homem autônomo, rotineiro e simplista numa aniquilação do próprio espaço e do próprio tempo como a priori. Somente o herdeiro do homem épico, o homem desprezado, é capaz de enxergar genuinamente espaço e tempo. Não são tempo e espaço que contêm o homem: ao contrário, o ser guarda seu tempo (HEIDEGGER, SARTRE, GADAMER). Olhar para o tempo é olhar para si, e não para os horizontes do mundo.

O homem autônomo atua dentro da realidade que tolhe a sua existência épica. Esse espaço ordenado é aquilo que predomina sobre o mundo, aniquilando o exterior e refutando a existência transcendental da natureza. A extinção da inocência científica e o avanço das tecnologias, acusadas de devorar o homem, são antes o ato de canibalismo do espaço e do tempo. A existência abandona a unificação ontológica da universalidade e constitui um falso universalismo, no qual a repetição mesma é limitada, instituída através da segurança. A primeira traição ontológica, que instância a repetição por meio do hábito vernacular e a partir das angústias do homem, é o exercício da derrota do indivíduo autônomo perante o desafio do novo. Sua independência imaginativa, bem como o fato de ser devorado pela técnica, é resultado de sua incapacidade de apropriação. O mundo se apropria das coisas, pois o mundo determina a universalidade. O mundo destrói o fora.

ZANLORENZI, Rafael. A significação do real na teoria do direito. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2010, p. 85.

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