Falei tanto de Justiça no texto "Comentários à aula do Medina" e cometi uma injustiça. Que incoerência! Não só injustiças, como também não tenho certeza se o objetivo do texto foi compreendido pelos leitores. Portanto, alguns esclarecimentos são necessários.
Mas antes da injustiça, preciso tratar de alguns temas.
O objetivo do texto era comentar alguns aspectos da interessante aula do Prof. Medina e fazer algumas reflexões sobre a efetividade da aplicação da multa com base no art. 461, parágrafo 5°. Mais que isso: o escopo final do texto era chamar à reflexão pessoas que não estão diariamente ligadas com o Direito. Pessoas que não estudam direito ou não trabalham com isso, pois querendo ou não, o Direito está ligado com todas as pessoas que nascem neste mundo. É como política. O problema é que existe um auto-engano no senso comum em pensamentos como "não me envolvo com política" ou "direito é coisa de advogado".
Enfrentei então uma primeira dificuldade ao tentar compartilhar aqui no blog aqueles pensamentos, que foi a escolha da linguagem. É difícil se fazer expressar de forma objetiva e plena sem utilizar a linguagem científica do Direito - termos e conceitos que fazem parte desta ciência.
Fui bem claro ao alertar no início do texto que a escolha deste veículo (o blog) foi uma intencional. Portanto, não limitei a discussão ao espaço acadêmico escrevendo um artigo científico de publicação em meios específicos. Pelo contrário, escrevi num blog pessoal e público que pode ser acessado e lido por qualquer pessoa que entre no Google e pesquise qualquer palavra que está neste texto.
Entretanto, houve escassez de linguagem técnica. Os colegas do curso que leram (até o momento recebi comentários do Michel, Gilberto, Samir) claramente devem ter notado isso. Mas é que há necessidade de transcender a discussão para além do âmbito jurídico por se tratar de um tema tão relevante. Houve uma tentativa de comentar um assunto debatido numa sala de aula num espaço público, para que mais pessoas possam pensar a respeito. Sou um otimista.
A escolha da linguagem foi, portanto, um limitador dos comentários no texto. Mesmo assim, não tive vergonha de copiar o link do post e enviar para o Prof. Medina, Doutor em Processo Civil pela PUC-SP e autor renomado de diversos livros sobre processo, para que ele fizesse a leitura também e pudesse comentar.
Pois bem. Agora vou explicar a injustiça que cometi.
Escrevi tal trecho: "Concordo com Medina em quase todos os pontos de sua aula, mas acho prejudicial essa aversão que o Professor tem a tudo que tenha relação com a common law."
A frase foi fora de contexto (explicarei em que contexto ela se adapta menos mal). Na realidade, me expressei muito mal e utilizei os termos errados. Usei palavras fortes (prejudicial, aversão, tudo que tenha relação), com radicalismo desnecessário. Não é atoa que gerou consequências.
Após enviar o link para o Prof. Medina via twitter, ele me respondeu: "Rafael, não sou avesso ao common law. Por favor, me ligue". Liguei (ele passou seu número pelo twitter também), e ele foi extremamente atencioso, mesmo estando num avião que iria de São Paulo até Belo Horizonte esperando a decolagem, ao me esclarecer diversos pontos em relação ao texto. Acho válido expô-los aqui.
Medina não é avesso à common law. Pelo contrário, o Professor tem dedicado parte de seus estudos para os institutos do direito anglo-americano e sua possível adequação no direito brasileiro. Tem, inclusive, apoiado a adoção de diversos elementos da common law através da efetiva adequação dos elementos à realidade jurídica brasileira. A crítica dele não é contra o contemp of court, a atribuição de eficácia ao precedente, ou qualquer coisa da common law (ou que tenha sua influência). A grande crítica que se faz é contra a importação superficial do direito americano ou inglês na esperança de que somente isto resolverá os problemas do direito brasileiro.
Pelo celular, argumentou que a importação de regras de direito estrangeiro não implica em resultados, e muitos pesquisadores têm defendido a ideia de que a commonlawlização do direito brasileiro seria viável, mas não atentam para o fato de serem mundos fáticos (não só jurídicos) díspares, completamente diferentes. A visão de um inglês é completamente diferente de um brasileiro.
De fato, isso eu senti na pele em Londres. O poder público tem muito prestígio. Não só os juristas são valorizados, como tudo o que é público tem valor porque simplesmente funciona! No mais, a figura do judge é completamente diferente da visão que os brasileiros possuem de seus juízes. Desrespeitar uma decisão judicial na Inglaterra é fato anormal. Aqui, anormal é cumpri-la sem reclamar.
No mais, Medina debateu diversos pontos da problemática. Conversamos no telefone por mais dez minutos e eu expliquei que a frase foi infeliz, pois o ponto era: como o assunto era pouco discutido em sala de aula devido à escassez de tempo, alguns alunos poderiam interpretar errado os comentários do Medina, tais como: "o estudo da common law é modismo no Brasil", e outros. Alunos que desconhecem os estudos do Medina poderiam achar que existe aversão à common law.
Mesmo assim, não é justificável ter feito tal afirmação, por isso me desculpo nessa oportunidade.
Acho que consegui esclarecer algumas coisas, não? De qualquer forma, agradeço desde já a sensibilidade do Professor Medina em abrir ainda mais a discussão (mesmo que por telefone) e pela ideia de retomarmos a discussão em sala de aula para que os alunos possam tirar essa suposta imagem que eu afirmei ser possível de ter sido construída (a interpretação errada da crítica aos estudos superficiais que alguns pesquisadores tem feito e defendido no Brasil).
A ideia do texto não era criticar o posicionamento de Medina. Muito pelo contrário, afinal, concordo com todas as ideias lançadas em sala. A ideia foi trazer a discussão para além do meio acadêmico - expor tais problemas num espaço público. Algo como um artigo daqueles que tem no O Diário no caderno opinião, só que na internet, chamando a galera à refletir um pouco.
Não sei se consegui. É um tema que não desperta interesse, desperta?
Como disse, sou um otimista. Acredito que é possível reconstruir a imagem do Poder Judiciário a fim de garantir uma melhor tutela dos direitos. Tenho esperança na geração que está por vir, já que esta está corrompida pela descrença na justiça. Verdade seja dita.
cara, só pelo fato de haver um diálogo sobre o tema já é interessante, ainda mais quando esse diálogo é feito aqui no blog pra que todos possam compreender..
ResponderExcluirmas uma coisa to descobrindo, infelizmente, nós juristas falamos coisas que somente nós entendemos! isso é mto chato, cara! se a gente fala é pra meia dúzia entender e não todo mundo... aí fica complicado.
É verdade, Michel. Nem minha mãe, que me ama de forma incondicional, aguenta me ouvir falar sobre Direito.
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