A polêmica em torno da semana literária do SESC em Maringá

"Capa do E-book Contos Maringaenses. Foto: Raoni Wonrath"

Achei gozado. Semana passada, estudando no apartamento do Baixo Augusta onde moro, recebi uma ligação do O Diário do Norte do Paraná, o jornal de maior circulação de Maringá (minha querida cidade natal). Era um repórter querendo saber minha opinião sobre as mudanças com relação à nova edição da Semana Literária do SESC, que acontece em setembro na Cidade Canção.

Na hora fiquei um pouco confuso e tentei processar as informações - por que minha opinião sobre um evento literário teria peso e não a de algum professor de literatura de alguma universidade local?

Antes de perguntar o motivo de minha opinião, o repórter se antecipou e explicou que a matéria estava sendo escrita em razão de uma polêmica gerada em 2010 em torno da semana literária.

As coisas então ficaram claras. Rapidamente, lembrei de uma matéria escrita em setembro do ano passado pelo Alexandre Gaioto sobre evento. Tudo tinha começado com uma tuitada da poetisa londrinense Ana Guadalupe: "Pelo jeito, só em Maringá transformaram a semana literária do Sesc em semana da literatura infantil". A típica frase irônica de Guadalupe tinha fundamento: segundo o relato de Gaioto, das 22 atrações, 15 eram voltadas para o público infantil. A notícia, que propositalmente dava relevo à intriga, ressaltava a falta de novos escritores maringaenses. Tanto Guadalupe quanto o brilhante Marcos Peres reclamavam da ausência de Nelson Alexandre, um dos contistas mais autênticos e subestimados da cidade.

A matéria deu ênfase ao desconhecimento dos novos autores da cidade. Na época, o próprio Nelson Alexandre afirmou com certo ar melancólico (que lhe é característico) que os responsáveis por organizar esses eventos literários provavelmente não faziam ideia de quem ele era ou do que escrevia. A frase não tinha a tônica de uma reclamação, mas era apenas uma constatação sincera sobre a clara distância entre os escritores independentes e as instituições que promovem eventos voltados à cultura para o público em geral, isto é, a velha ruptura entre o mainstream e o underground.

Bom. Mas onde eu entro nessa história? Na matéria impressa, não fui entrevistado tampouco citado (e nem deveria ser). A única participação que tenho nesse imbróglio é um comentário que fiz na versão on-line da notícia, na qual escrevi: "É verdade. Cadê a nova geração não tão nova assim?". A intenção da pergunta era ressaltar o fato de que a tal "nova geração" de escritores maringaenses de nova tem muito pouco. Na verdade, são todos escritores adultos e não uma cambada de adolescentes metidos a poetas ou contistas. O Nelson Alexandre - que integra o grupo Contos Maringaenses -, por exemplo, tem mais de trinta e escreve há muitos anos.

A matéria e o comentário deram repercussão. Em mesas de bar em Maringá (no Zé ou Manhattan), fui informado que a organizadora do evento, Laíde Sousa, não tinha gostado da forma como Gaioto tinha escrito sobre o evento, como que desdenhando das atrações voltadas para o público infantil. Paciência. Talvez se Gaioto fosse pai tivesse mesmo mais interesse nisso...

Na conversa pelo celular, o repórter do O Diário disparou: "Você foi um crítico da programação da semana literária do ano passado. O que você achou da inclusão de escritores maringaenses como Wilame Prado e o Alexandre Gaioto na edição de 2011?". 

Eu ainda não tinha lido a programação completa, apesar de ter recebido por e-mail. Deixei para ler depois. Na resposta, frustrei suas expectativas com um comentário tosco e uma réplica: "Ah, é? O Wilame e o Gaioto vão participar? Que legal, cara. Como que é isso?".

Acho que nessa hora o repórter deve ter ponderado que havia ligado para a pessoa errada. Mesmo assim, me explicou o que estava acontecendo: "O Wilame Prado vai lançar seu livro (Charlene Flanders, que voava em seu guarda-chuva roxo, mudou minha vida) e participar duma sessão de autógrafos. O Gaioto vai mediar a mesa Literatura e Política com o Miltou Hatoum. Ambos são escritores do Contos Maringaenses, como que você enxerga essa mudança da edição de 2010 pra de 2011?".

Aí me toquei que tinha feito a pergunta à toa. Numa noite no Tribo's Bar, o Gaioto havia me contado que iria mediar uma mesa com o Hatoum, um dos escritores preferidos dele. Ele estava empolgado. Também tinha me falado do lançamento do livro de contos do Wilame. Provavelmente a amnésia alcoólica apagou o conteúdo da conversa, que só foi lembrado depois da resposta do repórter. Tentei elaborar uma resposta adequada: "Olha...é uma mudança completa. Que eu saiba, ano passado não tinha nenhum escritor da nova geração participando do evento. Mas isso também não é culpa do SESC. Como que eles vão convidar os escritores locais se os escritores não cobram isso? O Contos Maringaenses é um projeto novo, ninguém conhecia os novos contistas da cidade. Eu acho que a mudança só aconteceu porque nós reclamamos. A organização da semana literária não tem culpa no cartório... Acho bacana que tenha dado um efeito imediato".

Imediatamente após a resposta que minimizou a polêmica em torno dos jovens escritores, o jornalista emendou: "E a participação de Alice Ruiz e Fabrício Carpinejar na edição Literatura e Sedução? Como você vê isso?".

Como não havia lido a programação, emudeci, refletindo sobre a questão e a participação dos dois autores. Dei uma resposta intuitiva, básica e sem sal: "Pois é, já mostra que o evento é voltado para um publico adulto interessado em literatura. Talvez seja uma resposta da crítica ao foco mais infantil do ano passado..".

O jornalista agradeceu, se despediu e desligou o telefone, talvez frustrado com a simplicidade de minhas respostas. Talvez ele esperasse frases polêmicas ou comentários críticos sobre o fato de Nelson Alexandre ter sido novamente negligenciado pela organização do evento. Talvez esperasse que eu dissesse que os blogueiros e novos escritores maringaenses não têm a menor pretensão de serem os futuros membros da Academia Maringaense de Letras ou talvez reclamasse da falta de apoio para um projeto tão importante quanto o e-book do Contos Maringaenses, idealizado por Michel Roberto de Souza e Marcos Peres.

De fato, poderia ter aumentado a polêmica e a potencial sensação de incômodo dos organizadores do evento com relação aos escritores independentes de Maringá. Acho mesmo que não sou a pessoa mais adequada para tratar do tema (por que não entrevistaram o próprio Michel Roberto ou o escritor Bruno Vicentini?), mas já que me concederam a oportunidade de falar sobre o assunto, acho interessante considerar a ideia de que os escritores maringaenses ainda não são devidamente reconhecidos porque não se mostram para o grande público e não reclamam de sua invisibilidade.

Talvez a matéria de André Simões publicada hoje coloque o ponto final na controvérsia surgida no ano passado e simbolize o início de uma parceria interessante entre o SESC, que é uma associação civil de comerciantes e não uma instituição estatal, e os escritores independentes de Maringá, ainda desconhecidos fora do restrito círculo underground da cidade.

Pelo menos, é o que eu espero.

9 comentários:

  1. Contos Maringaenses no SESC? É a Glória? Ou a Madalena? Devemos tomar chá? Pode ser de Cogumelo? (Bruno Vicentini).

    Polêmicas a parte, parabéns ao Gaioto e ao Wilame. Farei forças pra prestigiar o evento!

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  2. Dá-lhe Zanatta! Façamos andar esta fila!

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  3. Olá Zanatta. Gostei muito do seu post, assim como achei muito válida a matéria produzida pelo André Simões. Particularmente acho que a repercussão, a polêmica, é sempre algo muito maior do que o fato em si. No entanto, foi graças à repercussão que a semana literária do Sesc Maringá melhorou bastante, abrangendo a agenda de programações e possibilitando a participação de um público mais amplo e variado que curte livros. Sempre que converso com a Laíde, o que sinto é uma disposição por parte dela para melhorar sempre, dá a impressão que as portas de lá estão sempre abertas mas muita gente esquece ou simplesmente não quer entrar.

    Grande abraço! Sei que está em SP, mas gostaria muito da sua presença por aqui no lançamento do livro!

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  4. Gostei muito da programação da semana literária!

    Creio que todo tipo de fomento à cultura maringaense é válida, ainda mais quando são prestigiados também os artistas locais, além de outros artistas que são incríveis e que vão dialogar diretamente com o público maringaense.

    Parabéns ao SESC-Mgá, eventos assim devem acontecer com mais frequência, pois como vimos, o maringaense está ávido por cultura e ainda mais por uma cultura genuinamente maringaense!

    Com relação ao fato de o Repórter - acho que o André Simões - te ligar, creio que também foi válido, pois você foi um daqueles que mostrou algum tipo de preocupação com a semana literária no site do Diário, mesmo sem alguém ter te perguntado.
    Melhor agora que te perguntaram, pois só perguntam pra quem está interessado!

    Abraço, meu querido.

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  5. Algumas explicações pragmáticas da rotina do jornalismo diário: liguei para você, não para qualquer outro do Contos Maringaenses, porque era o seu telefone que o Gaioto tinha. Simples assim, hehe.

    Fiquei um pouco frustrado (embora eu esteja conformado com minha insignificância) de você escrever sobre mim como se fosse um completo desconhecido seu. Sou eu, André Simões, também participei do Contos Maringaenses, lembra? Você até elogiou minha camiseta do Sinatra... Ó vida, ó dor, ó mundo cruel.

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  6. Nossa, André. Você me tirou uma dúvida que me corroía há dias!

    Explico. O motivo da impessoalidade é que eu não tinha certeza de quem tinha me ligado. Na hora, eu não me toquei que era você! E mais: depois que você desligou o telefone, "troquei as bolas" e achei que tinha falado com um tal de Adriano. Tanto é que falei pro Michel: "Um repórter do O Diário, Adriano, me ligou agora pouco".

    Quando li a notícia assinada por você pensei encucado: Mas será que eu falei com o André Simões? Daí logo concluí: provavelmente esse tal Adriano, um estagiário, me ligou, fez a entrevista e o André fez a matéria.

    Soa ridículo, não? Mas foi bem isso que aconteceu.

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  7. Você não reparou que eu conversei com você como se estivesse falando com um estranho?

    Que cagada! Eu tava com a cabeça em outro lugar.

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  8. O ADRIANO, TA ME OUVINDO??

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