Richard Posner: eficientismo, maximização de riqueza e a análise econômica do direito

Segue abaixo um trecho da pesquisa de conclusão de curso, que aborda especificamente as teorias de Richard Posner sobre o direito norte-americano e de que forma o Judiciário deve buscar a eficiência econômica em suas decisões.



Na década de setenta, a Faculdade de Direito da Universidade de Chicago estava sob o comando do economista Aaron Director[1], responsável por modificar a estrutura do curso de Direito e introduzir elementos de economia, principalmente após os trabalhos inovadores de Ronald Coase acerca dos custos de transação, que demonstraram a importância do direito para os economistas.

Richard Posner, que havia sido aluno de Director e Coase, após diversos anos lecionando na Universidade de Chicago, publicou em 1973 a obra que é considerada um marco na história da análise econômica do direito, Economic Analysis of Law[2]. Neste livro, como afirma Francesco Parisi, Posner propõe a teoria de que “o elemento unificador central da common law é que suas regras são definidas para alcançar a eficiência”[3].

Richard Posner utiliza-se de linguagem e conceitos da ciência econômica para definir o sistema da common law norte-americana e propor, como teoria geral, uma análise econômica do direito. Sua ideia central, dentro de uma perspectiva econômica e de maximização da riqueza, é a de que a função básica do direito é alterar os incentivos[4].

Na opinião de Francesco Parisi, a ideia central destra primeira fase do pensamento posneriano é de que o sistema jurídico da common law apresenta as mesmas características do mercado, buscando sempre a alocação eficiente de recursos:

A teoria do direito de Posner é simples: as regras da common law são eficientes (Posner 1973, p. 98). Os juízes da common law definem uma norma jurídica como se eles conscientemente pesassem os custos relativos aos litigantes em evitar o litígio e, em seguida, determinassem como otimizar o comportamento futuro. Os juízes, é claro, elaboram seus votos (opinions) incorporando termos e conceitos jurídicos, mas a análise das regras centrais da common law demonstram que essas normas buscam efeitos idênticos aos que resultariam da análise de custo-benefício (Posner 1973, p. 99). As regras da common law servem puramente a um propósito: a criação de incentivos para que os indivíduos se comportem de modo que a taxa de disputas, seja por acidentes, quebras contratuais, delitos ou crimes, seja socialmente ótima. (...) A common law serve para reforçar o mercado. De fato, os procedimentos da common law imitam aqueles do mercado: os litigantes competem para o 'costume' do Tribunal do Júri.[5]

Posner, em sua análise descritiva do direito norte-americano, advoga por um sistema utilitarista, consequencialista e pragmático, em muito influenciado pelo pensamento de Bentham e Holmes. Constata-se, neste aspecto, que a avaliação da análise de custos e benefícios no direito é essencialmente consequencialista, em oposição a avaliações principiológicas, tal como a defendida por Ronald Dworkin[6].

Após a publicação deste text-book para os acadêmicos de Chicago, Posner foi identificado como um dos criadores do movimento Law and Economics, que, na opinião de Fabiano de Rezende Lara, tem como pressuposto “a ideia de que o direito é instrumento para conseguir fins sociais, sendo que o fim a conseguir é o da eficiência econômica”[7].

No mesmo sentido, Mercuro e Medema apontam que a característica que de fato define a abordagem de Richard Posner e da Escola de Chicago é a aplicação de análise micro-econômica (preço-teórica) no direito, partindo de três premissas: (1) os indivíduos são maximizadores racionais de suas satisfações em comportamentos fora do mercado, bem como no mercado; (2) os indivíduos respondem aos incentivos de preços no comportamento de mercado e fora do mercado; (3) regras e ações jurídicas podem ser avaliadas com base na eficiência, ao ponto que as decisões judiciais devem promover a eficiência[8].

Entretanto, compreender a proposta de tal escola científica exige-nos responder uma questão fundamental e preliminar: afinal, o que é a eficiência defendida pela Law and Economics como princípio norteador da common law?

Para Jules Coleman, o conceito de eficiência é complexo e amplamente mal interpretado, em razão de três modelos identificáveis, que são ignorados pelos juristas: a eficiência alocativa, a eficiência paretiana e a eficiência de Kaldor-Hicks[9].

A eficiência alocativa, tal como utilizado por Coase em sua teoria dos custos de transação, diz respeito à produção certa ou adequada de determinada quantidade de produto ou serviço e relaciona-se com a lei básica de oferta e demanda, bem como com a oscilação de preços no mercado. A eficiência paretiana, elaborada pelo economista italiano Wilfredo Pareto, diz respeito à satisfação de preferências individuais. Uma situação é definida como pareto-eficiente se é impossível modificá-la a ponto de ao menos aumentar a riqueza de uma pessoa sem fazer com que a riqueza de outra diminua[10]. Já o modelo de eficiência Kaldor-Hicks, elaborada a partir das teorias dos economistas Nicholas Kaldor e John Hicks, aponta que frequentemente haverá perdedores, sendo irreal a exigência paretiana. Neste modelo, para atingir-se a eficiência, basta que os benefícios gerados sejam suficientes para compensar a perda dos prejudicados, beneficiando ao menos uma pessoa[11].

Richard Posner tem para si que a economia é uma ferramenta fundamental para analisar questões que os juristas não conseguem conectar com problemas concretos, tal como critérios de decibilidade. Além disso, Posner justifica a utilização da economia na formulação de novas teorias jurídicas em razão de ser uma ciência de escolhas racionais, por excelência. Neste viés, orientado pela premissa da alocação de recursos escassos, o homem seria um maximizador de utilização racional:

A premissa básica da economia que guia a versão da análise econômica do direito que apresento é que as pessoas são maximizadoras racionais de suas satisfações – todas as pessoas (com exceção de crianças pequenas e os mentalmente retardados) em todas as suas atividades (exceto sob a influência de psicose ou desarranjos mentais ocasionados por uso de drogas ou abuso de álcool) que envolvem escolha.[12]

A partir de tal premissa econômico-utilitarista, Richard Posner afirma que os legisladores também são maximizadores racionais que objetivam a manutenção de seus cargos com re-eleições. Para tanto, elaboram leis que nada mais são do que “acordos” (deals) firmados com grupos de interesse organizados da sociedade civil, em troca de apoio político[13]. Todavia, a legislação no sistema anglo-americano não é auto-aplicável, dependendo da interpretação e aplicação dos Tribunais. Os juízes, neste viés, possuem um duplo papel: interpretar os acordos dos grupos de interesses incorporados pela legislação e garantir o serviço público básico de resolução legítima de conflitos. Neste último papel, não apenas decidindo casos de acordo com normas pré-existentes, mas também elaborando estas normas[14].

Com base nesta teoria de maximização racional, Arnaldo Godoy aponta um dos fundamentos conceituais de Posner e da Escola de Chicago:

Para o movimento direito e economia a base para a decisão de um juiz deve ser a relação custo-benefício. O direito só é perspectivo quando promove a maximização das relações econômicas. A maximização da riqueza (wealth maximization) deve orientar a atuação do magistrado.[15]

Richard Posner considera a hipótese da evolução da common law americana no sentido da eficiência como expressão jurídica de um sistema social voltado à maximização da riqueza da sociedade[16], revisitando alguns conceitos utilitaristas[17].

O sistema norte-americano refletiria para Posner, nas palavras de Bruno Salama, “um arcabouço jurídico que permitiria que o sistema econômico fosse cada vez mais próximo dos resultados que um mercado com competição perfeita proporcionaria”[18], ou seja, o ordenamento jurídico e o Poder Judiciário seriam meros instrumentos para a maximização da riqueza e promoção da eficiência, num contexto economicamente liberal.

Ao revisitar a teoria dos custos de transação desenvolvida por Coase em Chicago, Posner defendeu, nesta primeira fase (1973-1990), que ao direito compete a promoção da eficiência, minimizando os custos de transação ao definir claramente os direitos de propriedade, criando também soluções baratas e efetivas quando houver o descumprimento de um contrato[19]. Ademais, Richard Posner propõe uma nova definição do conceito de justiça - aplicável pelo menos na common law norte-americana em razão de sua evolução histórica - baseado na eficiência paretiana e na eficiência Kaldor-Hicks.

Mariana Prado explica que “ele [Posner] utiliza-se de um critério kantiano de consentimento para afirmar que a eficiência paretiana promove situações que podem ser submetidas ao consentimento de todos”[20]. Em outros termos: para Posner, todos consentiriam com decisões nas quais ninguém é prejudicado e ao menos uma pessoa é beneficiada, ou tem sua riqueza aumentada (conceito de eficiência de Pareto). Entretanto, tal situação é irreal, motivo pela qual a eficiência de Kaldor-Hicks[21] é o critério a ser utilizado, pois prevê a possibilidade de compensação à parte que teve perdas.

De acordo com a concepção de justiça posneriana, a eficiência teria utilidade normativa como critério único para tomada de decisões, devido ao consenso de pessoas racionais e auto-interessadas. Coleman explica o argumento do jurista da Law and Economics:

Para Posner, a questão de se a maximização de riqueza Kaldor-Hicks-eficiente é justificada é a questão de se é apropriado dizer aos perdedores em intervenções ou instituições baseadas na eficiência Kaldor-Hicks que eles consentiram com suas perdas. Como forma de introduzir seu argumento, Posner argumenta que ele propõe defender a maximização de riqueza ao apelar à noção de consenso, na qual entende-se que 'se você compra um bilhete de loteria e não ganha, então, enquanto não houver prova de fraude, você consentiu com sua perda'.[22]

Jules Coleman argumenta que se uma pessoa compra um bilhete na loteria e não ganha, sua perda pode ser legítima e justa. Seria justa, pois a pessoa assume, por consentimento, o risco e por voluntariamente tentar a sorte numa empresa arriscada. Mas isso não significa que a pessoa concorde com a perda. Consentir com o risco e assumi-lo não é consentir com a perda e assumi-la, indendentemente da justeza da perda, razão pela qual a teoria posneriana, neste aspecto, é falha.

Na visão de Posner, o critério para avaliar as instituições, incluindo o Judiciário, é a maximização da riqueza da sociedade. Regras jurídicas e decisões judiciais que promovam a maximização da riqueza seriam justas. As que não promovessem, seriam injustas. Tal tese pode-nos parecer absurda ou, pelo menos, radical. Entretanto, em linhas gerais, esta foi a teoria de justiça defendida por Richard Posner na primeira fase de sua carreira jurídica, sintetizada nas obras Economic Analisys of Law (1973) e Economics of Justice (1981)[23].

A teoria da eficiência desenvolvida por Posner em sua análise econômica do direito fez com que ele ganhasse notoriedade. Ao mesmo tempo, o autor foi alvo de duras críticas por parte de alguns jusfilósofosos de Harvard, como Duncan Kennedy e Ronald Dworkin. De acordo com o pensamento deste último, a maximização da riqueza não é atraente e é incoerente como norma ética, pois suas falhas normativas geram incertezas sobre sua validade como hipótese positiva ou descritiva[24].

Não obstante as críticas no âmbito científico, em razão do prestígio da Escola de Chicago no início da década de 80 e por motivos políticos em adotar tal teoria jurídica liberal, Posner foi nomeado pelo Presidente Ronald Reagan para assumir a posição de Juiz na United States Court of Appeals for the Seventh Circuit no final de 1981, subindo ao cargo de Chief Judge no ano de 1993. Talvez aí resida um dos motivos da disseminação da análise econômica do direito nos Estados Unidos. Posner não era somente um acadêmico que defendia a análise econômica do direito no âmbito acadêmico, mas aplicava tais teorias em suas razões de decidir como Juiz (opinions), ao passo que publicava inúmeras obras defendendo tal visão do direito.

A teoria do eficientismo e da maximização da riqueza marca a primeira fase do pensamento posneriano. Após receber as duras críticas de Dworkin e outros jusfilósofos, Posner reestruturou sua análise do Direito e, ao escrever a obra The Problems of Jurisprudence no início da década de noventa, associou-se ao pragmatismo, considerando a economia como instrumento e meio para prever o comportamento humano, o que poderia ser efetivamente ser utilizado pelo direito, em especial na demarcação destes padrões de comportamento fixado pela jurisprudência.

Nesta nova fase de Posner, identificada com o pragmatismo, o eficientismo foi abandonado em sua forma inicial, sendo a eficiência considerada apenas como um critério subsidiário de decisão e não o principal. Além disso, a própria utilização da eficiência Kaldor-Hicks foi relativizada em favor do pragmatismo. Neste sentido, escreveu Posner recentemente:

Eu não quero apostar todas minhas fichas na defesa do conceito Kaldor-Hicks de eficiência. Para mim, o teste final do emprego da análise de custo-benefício é pragmático: se sua utilização melhora o desempenho do governo em qualquer sentido de melhoria que o observador considere adequada.[25]

Aqui, não será discutida a fase pragmática de Richard Posner. Para esta análise, importa tão somente identificar quais são os principais conceitos da Escola de Chicago (eficiência econômica, maximização da riqueza, etc).

À guisa de conclusão, cumpre-se destarcar as consequências do surgimento da análise econômica do direito com Richard Posner em Chicago: uma vez proposto e aceito o paradigma da análise interdisciplinar entre direito e economia proposta por tal escola, adveio a fase que Mackaay classifica como “paradigma questionado”, na qual surgiram as críticas ao pensamento posneriano[26] e à análise econômica do direito, não só nos Estados Unidos[27], mas na própria Europa Ocidental[28].


[1] Aaron Director (1901-2004) formou-se em Economia em Chicago e lecionou na universidade até assumir um emprego no Departamento do Tesouro em 1933. Nesta década, Director estudou na London School of Economics, onde conheceu Friedrich August Hayek. Em 1946, Director passou a dar aulas na Faculdade de Direito da Universidade de Chicado e ajudou a fundar o movimento Law and Economics lá. Sua irmã, Rose, casou-se com o economista liberal Milton Friedman. Cf. HAYEK, Friedrich A. The Road to Serfdom: text and documents. London: University of Chicago Press, 2007, p. 16.
[2] O livro foi lançado no ano de 1973 como text-book para ser utilizado pelos alunos do curso de Law & Economics da Universidade de Chicago e é considerado um marco na análise econômica do direito. O trabalho, com mais de quatrocentas páginas, divide-se em sete partes, abordando temas como a natureza da argumentação jurídica econômica (economic legal reasoning), a ligação da common law com a eficiência, a regulação do mercado pelo Estado com medidas antitruste, o direito das empresas e dos mercados financeiros, a distribuição das riquezas e da arrecadação tributária, o processo legal americano e a proteção constitucional à economia de mercado livre. Cf.:  POSNER, Richard. Economic Analysis of Law.  6. ed. New York: Aspen, 2003.
[3] PARISI, Francesco. op. cit., p. 359.
[4] Assim aduz Richard Posner: “The basic function of law in an economic or wealth-maximization perspective is to alter incentives. This implies that law does not command the impossible; a command that is impossible to fulfill will not alter behavior. The impossible command. (...) The requirement that law must treat equals equally is another way of saying the the law must have a rational structure, for to treat differently things that are the same is irrational. Economics theory is a system of deductive logic: when correctly applied, it yields results that are consistent with one another. Insofar as the law has an implicit economic structure, it must be rational; it must treat cases alike. (...) Law as a system for altering incentives and thus regulating behavior must also be public. (...) Finally, the economic theory of law presupposes machinery for ascertaing the facts of a law is weakened (and in the limit would disappear) if enforced without regard to wheter the circunstances are those to which law was intended to apply”. POSNER, Richard. Economics of Justice. Cambrigde: Harvard University Press, 1983, p. 75.
[5] “Posner's theory of the law is simpler: common law rules are efficient (Posner 1973, p. 98). Common law judges define a legal rule as if they consciously weigh the relative costs to the disputants of avoiding the dispute and then consciously determine how to optimize future behaviour. Judges, of course, draft opinions incorporating legal terms and concepts, but the analysis of the central rules of the common law shows that these rules achieve effects identical to those that would result where cost-benefit calculations were express (Posner 1973, p. 99). Common law rules serve purely a deterrent purpose: to create incentives for individuals to behave so that the rate of disputes, whether accidents, contract breaches, trespasses or crimes, is socially optimal. For most private law disputes, the correct marginal incentives are established by setting penalties equal to actual loss; transferring the damages to victims is inessential (since it affects the distribution of wealth only), except that it encourages victims to bring suit and to trigger the generation of optimal rules”. PARISI, Francesco. op. cit., p. 353.
[6] Dworkin contra-argumenta a tese de Posner de que as regras da common law buscam sempre as alocações de recurso eficientes e sustenta a tese de que as decisões judiciais são geradas por princípios, não só por políticas: “Em seu aspecto descritivo, a tese dos direitos sustenta que, nos casos difíceis, as decisões judiciais são caracteristicamente geradas por princípios, não por políticas. As pesquisas recentes sobre as ligações entre a teoria econômica e o direito costumeiro talvez pudessem sugerir o contrário: que os juízes quase sempre decidem com base em políticas e não em princípios. Devemos, porém, ter o cuidado de distinguir entre duas proposições que, segundo se afirma, foram estabelecidas por essas pesquisas. Argumenta-se, em primeiro lugar, que é possível demonstrar que quase todas as regras desenvolvidas pelos juízes em campos tão díspares quanto o delito civil, o contrato e a propriedade atendem ao objetivo coletivo de tornar as alocações de recurso mais eficientes. Em segundo lugar, argumenta-se que em certos casos os juízes fundamentam suas decisões explicitamente na política econômica. Nenhuma dessas afirmações subverte a tese dos direitos. A primeira afirmação não faz referência alguma às intenções dos juízes que decidiram os casos por meio do estabeleciemnto de regras que aumentam a eficiência econômica. Ela não pressupõe que esses juízes estavam conscientes do valor econômico de suas regras, ou mesmo que teriam reconhecido esse valor como um argumento favorável a suas decisões. Na maioria dos casos, a evidência sugere o contrário. (...) A primeira alegação pode igualmente sugerir a conclusão contrária que mencionei: a de que nossas idéias atuais sobre o bem-estar geral refletem nossas idéias sobre o direito individual. O professor Posner, por exemplo, argumenta em favor dessa alegação ao pressupor uma concepção particular da alocação eficiente de recursos. Diz Posner que o valor de um recurso escasso para um determinado indivíduo é medido pela quantidade de dinheiro que ele está disposto a pagar por esse recurso, de tal modo que o bem-estar da comunidade é maximizado quando cada recurso está nas mãos de alguém que pagaria mais do que qualquer outro para possuí-lo. É difícil, porém, entender tal concepção de valor como evidente por si mesma ou neutra. Ela é compatível com uma teoria política que celebra a concorrência, mas muito menos compatível com uma teoria mais igualitária, pois desqualifica as reivindicações dos pobres, que estão dispostos a gastar menos porque tem menos para gastar. A concepção de valor de Posner parece ser, portanto, tanto a conseqüência como a causa de uma teoria dos direitos individuais. De qualquer modo, porém, a tese antropológica da primeira afirmação não constitui ameaça à tese dos direitos. Mesmo se admitirmos que a teoria dos direitos de um juiz é determinada por um senso institntivo do valor econômico, e não o contrário, ainda assim poderemos argumentar que ele se apóia nessa teoria, não na análise econômica, para justificar as decisões nos casos difíceis. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 151-153.
[7] LARA, Fabiano T. R. Análise econômica do direito como método e disciplina. Revista e-civitas. Belo Horizonte, v. 1, n. 1, 2008, p. 10.
[8] MERCURO, Nicholas; MEDEMA, Steven. op. cit., p. 57.
[9] COLEMAN, Jules. Efficiency, Exchange, and Auction: Philosophic Aspects of the Economics Approach to Law. California Law Review, v. 68, n. 2, Mar, 1980, p. 222.
[10] Robert Cooter e Thomas Ulen definem o conceito da seguinte maneira: “A particular situation is said to be pareto efficient if it is impossible to change it so as to make at least one person better off (in his own estimation) without making another person worse off (again, in his own estimation). For simplicity’s sake, assume that there are only two consumers, Smith and Jones, and two goods, umbrellas and bread. Initially, the goods are distributed between them. Is the allocation Pareto efficient? Yes, if it is impossible to reallocate the bread and umbrellas so as to make either Smith or Jones better off without making the other person worse off”. COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law and Economics. 3. ed. Reading: Longman Publishing, 2000, p. 10.
[11] “Like Pareto superiority, Kaldor-Hicks efficiency is a relational property of states of affairs. One state of affairs (E’) is Kaldor-Hicks efficient to another (E) if and only if those welfare increases in the move from E to E’ could fully compensate those whose welfare diminishes with a net gain in welfare. Under Kaldor-Hicks, compensation to losers is not in fact paid. Were the payment transaction costless and full compensation give to the losers, Kaldor-Hicks distributions would be transformed into Pareto-superior ones. This characteristic of Kaldor-Hicks has led some to refer to it as a ‘potential Pareto-superior’ standard”. COLEMAN, Jules. Markets, morals and the law. Cambridge: Cambridge University Press, 1988, p. 98.
[12] “The basic assumption of economics that guides the version of economic analysis of law that I shall be presenting is that people are rational maximizers of their satisfactions – all people (with the exception of small children and the profoundly retarded) in all of their activities (except when under the influence of psychosis or similarly deranged through drug or alcohol abuse) that involve choice”. POSNER, Richard. The problems of Jurisprudence. Chicago: Chicago University Press, 1993, p. 353.
[13] Ibidem, p. 354.
[14] Ibidem, p. 356.
[15] GODOY, Arnaldo. Direito e Economia: Introdução ao movimento Law and Economics. Revista Jurídica, Brasília, v. 7, n. 73, jun/jul, 2005, p. 4.
[16] Quanto ao conceito de maximização de riqueza, Posner nos esclarece que “a riqueza em maximização de riqueza refere-se à soma de todos os bens e serviços tangíveis e intangíveis, ponderados por dois tipos de preços: preços ofertados (o que as pessoas se predispõem a pagar por bens que ainda não possuem) e preços solicitados (o que as pessoas pedem para vender o que possuem). Se A estiver disposto a pagar até $100 pela coleção de selos de B, ela vale $100 para A. Se B estiver disposto a vender a coleção de selos a qualquer preço acima de $90, ela vale $90 para B. Portanto, se B vender a coleção de selos para A (digamos por $100, mas qualitativamente a análise não é afetada por nenhum preço entre $90 e $100 – e é somente dentro desses limites de viaração que a transação vai ocorrer), a riqueza da sociedade aumentará em $10. Antes da transação, A tinha $100 em espécie, e B tinha uma coleção de selos valendo $90 (um total de $190); depois da transação, A tem uma coleção de selos que vale $100 e B tem $100 em espécie (um total de $200). A transação não vai aumentar a riqueza calculada – o produto interno bruto, a renda nacional ou coisas do gênero – em $10; não vai aumentá-la em nada a menos que a transação seja contabilizada e, se assim o for, é provável que aumente a riqueza calculada ao preço de compra total de $100. Contudo, o verdadeiro acréscimo à riqueza social consiste no incremento de $10 em satisfação não-pecuniária que A extrai da compra, comparado ao de B”. POSNER, Richard. Problemas de filosofia do direito; tradução Jefferson Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 477-478.
[17] Da tradição utilitarista, Richard Posner mantém dois traços fundamentais: uma concepção consequencialista de justiça e a noção de cálculo individual como ponto de partida das relações em sociedade. Ao mesmo tempo, Posner substitui o critério de felicidade por maximização da riqueza. Cf. SALAMA, Bruno. História e Declínio do Eficientismo. Cf. SALAMA, Bruno Meyerhof. A História do Declínio e Queda do Eficientismo na Obra de Richard Posner. In: LIMA, Maria Lúcia L. M. Pádua (Coord.). Trinta Anos de Brasil: Diálogos entre Direito e Economia. São Paulo: Saraiva, 2010.
[18] SALAMA, Bruno. Direito, Justiça e Eficiência: A Perspectiva de Richard Posner. Fundação Getúlio Vargas. Direito GV, São Paulo, Aug, 2008, p. 4. Disponível em: http://works.bepress.com/bruno_meyerhof_salama/30 Acesso em: 12 Mai. 2010.
[19] POSNER, Richard. El Análisis Econónimo del Derecho en el Common Law, en el sistema romano-germánico, y en las naciones en desarrollo – trad. Enrique Pasquel. Revista de Economía y Derecho, v. 2, nº. 7, Invierno, 2005, p. 9.
[20] PRADO, Mariana. Eficiência: Análise de Custo Benefício e o Direito. In: BITTAR, Eduardo C. Temas de Filosofia do Direito. Barueri: Manole, 2004, p. 59.
[21] “Do ponto de vista analítico, o critério de Kaldor-Hicks permite tratar separadamente o problema da eficiência (vista como maximização da riqueza) do problema da sua distribuição. Isto é, ele permite tratar analiticamente de maneira diversa os problemas do ‘tamanho da pizza’ e da ‘distribuição dos seus pedaços’. Mas, como é óbvio, do ponto de vista político esses problemas estão imbricados. Por outro lado, como se vê, o critério de Kaldor-Hicks está prima facie em contradição com o critério de Kantiano de autonomia e consenso. Afinal, ele pressupõe a existência de perdedores (ainda que, como se viu, as perdas desse grupo são inferiores às perdas dos ‘ganhadores’). O argumento implicitamente pressupõe que o governo irá agir em bases éticas, o que evidentemente nem sempre ocorre. Essa circunstância põe, então, o problema da possibilidade de compatibilização entre a maximização de riqueza, espelhada no critério de Kaldor-Hicks, e a condição Kantiana de permissão de mudanças pela via consensual. A resposta de Posner a esse desafio foi a de que os dois preceitos – maximização de riqueza e consenso – seriam compatibilizáveis a partir do critério de ‘compensação ex ante’”. SALAMA, Bruno Meyerhof. A História do Declínio e Queda do Eficientismo na Obra de Richard Posner. In: LIMA, Maria Lúcia. op. cit., p. 19.
[22] COLEMAN, Jules. op. cit., p. 118.
[23] Caracterizando assim o movimento Law & Economics da Escola de Chicago, o qual foi amplamente aceito nos Estados Unidos a partir da década de 80, propagando-se para a Europa na década de 90 e, recentemente, no Brasil, em especial nos cursos de pós-graduação, como se denota na grade curricular dos cursos da Fundação Getúlio Vargas, Ponticífia Universidade Católica e Universidades Federais.
[24] Dworkin argumenta que a vontade de pagar por um item não é somente determinada pela preferência pelo item, mas também pela capacidade para pagar. Assim, um item escasso poderia acabar nas mãos de um homem rico, que mal precisa de tal item, ao invés de uma pobre pessoa que desesperadamente o necessita, mas simplesmente não pode pagar a mesma quantia. Esta situação está de acordo com o princípio da maximização de riqueza (pois a venda para o homem mais rico geraria mais riqueza para a sociedade), entretanto a utilidade total não é maximizada. Em segundo lugar, a maximização da riqueza pode levar à consequências que podem ser consideradas como injustas. É o caso do exemplo mencionado, mas também pode ser injusta em casos em que a utilidade total é maximizada, mas dividida de forma desigual. Em terceiro lugar, Dworkin argumenta que o princípio da maximização da riqueza interfere somente na autonomia individual enquanto fosse garantida por direitos individuais. Ele menciona o caso em que A coloca um valor mais alto à um item do que o proprietário B faz. Um ditador benevolente iria então maximizar a riqueza ao retirar da posse de B o item, passando para A. Para a análise completa da crítica de Dworkin à Posner, Cf.: DWORKIN, Ronald. Is Wealth a Value? Journal of Legal Studies, v.9, 191, 1980.
[25] “I do not want to stake my all on a defense of the Kaldor-Hicks concept of effciency. For me the ultimate test of cost-benefit analysis employing that concept is a pragmatic one: whether its use improves the performance of government in any sense of improvement that the observer thinks appropriate. Throughout this comment, when I use the term cost-benefit analysis without qualification it is in the Kaldor-Hicks sense, but it may refer to any of the three uses of cost-benefit analysis that I have identified as pure evaluation, as an input into decision, or as the decision rule”. POSNER, Richard. Cost-Benefit Analysis: Definition, Justification, and Comment and Conference Papers. Journal of Legal Studies, n. 29, 1153, Jun., 2000, p. 3.
[26] Jules Coleman questionou a base ética da teoria de Posner sobre a maximização da riqueza e defendeu que a eficiência de Kaldor-Hicks adotada por Posner não é um princípio digno de ser adotado, tampouco não pode ser o fim maior do Judiciário: “Suppose we could overlook the serious conceptual problems that reliance on prices creates for the system of wealth maximization. We should still have to ask wheter wealth maximization constitutes na attractive moral maxim, one the law in particular ought to promote. There are two kinds of questions we could ask about the normative appeal of wealth maximization: one narrow, one general. The narrower question concerns the relative attractiveness of wealth maximization vis-à-vis utilitarianism. The point of the choice is: If one is committed to pursuing efficiency as a fundamental social goal, are one’s argument for doing so enhanced if efficiency is understood as maximizing wealth or maximizing utility? The more general question concerns the attractiveness of wealth maximization vis-à-vis the full range of alternative moral theories, including other consequencialist theories as well as nonconsequencialist ones such as libertarianism or Rawlsian justice. This question does not focus on alternative reasons for pursuing efficiency, but on the issue of whether the pursuit of efficiency, rooted either in utility or wealth maximization, is preferable to some other conception of right action or justice. This is the question of whether and to that extent social institutions should be arranged to pursue efficiency”. COLEMAN, Jules. op. cit., p. 108.
[27] Na Universidade de Harvard, os trabalhos de Duncan Kennedy e Roberto Mangabeira Unger questionaram de forma incisiva os trabalhos da Escola de Chicago, mantendo fortes ligações com o realismo jurídico de Oliver Wendell Holmes, a sociologia jurídica de Roscoe Pound, o marxismo ocidental de Max Horkheimer e Theodor Adorno, e o estruturalismo francês de Michel Foucault.
[28] Friedrich August von Hayek, um dos maiores representantes da Escola Austríaca, defendeu que a common law deveria ser um sistema de “ordem espontânea”, ou seja, que o sistema jurídico produzido pela gradual interação entre os tribunais e os casos funcionaria melhor que um sistema legal planejado. Hayek criticou a visão de Posner, que conceituava a common law como uma coleção de discrepantes regras. Quanto à função normativa do direito na sociedade, Posner defendia que os Juízes deveriam conscientemente utilitzar do direito para designar objetivos sociais com base na maximização da riqueza, enquanto que Hayek, ao contrário, defendia que a função do direito era criar condições necessárias para a manutenção da ordem espontânea da sociedade, incluindo a ordem espontânea da própria common law. Cf.: ZYWICKI, Todd. Posner, Hayek & The Economic Analisys of Law. Iowa Law Review, Vol. 93, No. 2, pp. 559-603, Fev. 2008; George Mason Law & Economics Research Paper No. 07-05. 

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